sábado, 22 de abril de 2017

Caminhadas Aleatórias Clássicas (Random Walk)

Embora a natureza tenha as suas leis muito bem determinadas (mesmo que nós não tenhamos consciência de todas elas!), mas em uma análise rigoroso sempre há alguma fração de não determinismo em todos os processos naturais, mesmo que este fração seja diminuta em alguns casos.

Desta forma, sempre é possível ter uma visão estatística do que se deseja descrever física, matemática ou computacionalmente. Ou seja, modelos rigorosamente realísticos devem utilizar de alguma forma a teoria da probabilidade em seus processos. Para tanto, ao olhar da mecânica estatística (física) é possível definir um sistema macroscópico como sendo um conjunto de sistemas microscópicos (ou do inglês, um ensemble), de cardinalidade muito alto (tendendo ao infinito).

Uma forma muito simples conceitualmente, e também muito interessante, de se modelar vários processos naturais  (pelo menos em primeira aproximação) é o procedimento chamado "Caminhada Aleatória", ou do inglês Ramdom Walk. Este procedimento tem inúmeras aplicabilidades, desde o mundo microscópico até o astronômico, permeando as ciências da física, matemática, estatística, química, biologia, dentre outras.

Hipoteticamente, é possível de definir uma Caminhada Aleatória através do enunciado do  seguinte problema:  Seja um indivíduo que se encontra em um estado de embriagues alcoólica. Este indivíduo está bêbado o suficiente para não ter controle sobre os seus passos, mas está sóbrio o suficiente para conseguir ficar de pé e caminhar. Inicialmente o indivíduo está em um bar, e visto que o seu dinheiro acabaou, só resta para ele voltar a pé para sua residência.

Por simplicidade, considere o problema unidimensional, ou seja, o bêbado só poderá dar um passo por unidade de tempo, sendo este ou para a direita ou para a esquerda. Dado o estado de embriagues do indivíduo, todos os seus passos são considerados independentes dos respectivos passos anteriores. Suponha também que todos os passos tenham o mesmo tamanho $l$. Logo, cada vez que o bêbado dá um passo, a probabilidade deste passo ser para a direita será $p$ e para a esquerda será $q=1-p$. No caso mais simples $p=q$, o que no nosso problema significa que a caminhada do bêbado está ocorrendo em uma região plana, não havendo nenhum privilégio para o passo a direita ou a esquerda. Contudo, no caso geral $p \neq q$, o que implicaria, por exemplo, a caminhada do bêbado em uma ladeira.

Assim, admitindo que o ponto de partida do bêbado seja o bar (localizado em $x=0$) e que toada a sua caminhada ocorrerá sobre o eixo $x$ (uma dimensão), a localização do bêbado tem que ser da forma,

\begin{equation}
x = ml
\end{equation}
onde $m$ é um inteiro (positivo, negativo ou zero)em um dado instante qualquer.



Desta forma, a questão natural é: depois de $N$ passos, qual a probabilidade do bêbado estar na posição $x=ml$? Ou equivalentemente, se sua residência está a $k$ passos do bar ($N \geq k$), qual a probabilidade do bêbado chegar em sua casa depois de $N$ passos?

Em uma visão estatística, seria necessário realizar várias vezes a observação do bêbado andando ou considerar vários homens bêbados realizando a caminhada em busca de sua casa ou mesmo tempo. Neste último senário, depois de $N$ passos, qual a fração destes homens estaria na posição $x=ml$? Ou ainda, qual a fração destes homens teria alcançado a sua casa (todos estão tentando chegar até a mesma casa!).

Este problema fictício (assim espero...) aparentemente bob, ilustra alguns resultados fundamentais da teoria da probabilidade. Assim, sendo o bêbado representado por uma partícula, depois de $N$ passos , cada um de tamanho $l$, tal partícula estará localizada em $x=ml$, sendo $m$ um inteiro de valor,
\begin{equation}
-N \leq m \leq N
\end{equation}

Deseja-se calcular a probabilidade de se encontrar a partícula na posição $x=ml$ depois de $N$ passos. Para tanto, seja $n_1$ o número de passos dados para a direita, e $n_2$ o número de passos para a esquerda. Portanto,
\begin{equation}
N=n_1 + n_2
\end{equation}

O deslocamento medido em unidades de comprimento de um passo, medidos a partir da posição do bar ($x=0$), é dado por
\begin{equation}\label{eqn:m}
m=n_1-n_2
\end{equation}
Observe que $m$ também poderia ser definido como $m=n_2-n_1$. Contudo, como está sendo considerado que a direção positiva está para a direita, utiliza-se a Equação \ref{eqn:m}. Vale também frisar que se for conhecida a quantidade de passos para a direita $n_1$ (ou para a esquerda $n_2$) é possível se determinar sua posição, visto que se conhece $N$,
\begin{equation}
m=n_1-n_2 = n_1-(N-n_1) = 2n_1 - N
\end{equation}
Dado que $2n_1$ é um número par, $m$ será par se $N$ for par, e será ímpar se $N$ também assim for.

Como todos os passos são estabelecidos independentemente, cada passo é caracterizado para sua respectiva probabilidade,

  • $p$ - probabilidade do passo ser para a direita;
  • $q=1-p$ - probabilidade do passo ser para a esquerda.
Portanto, qualquer sequência de $n_1$ passos para a direita e $n_2$ passos para a esquerda terá uma probabilidade dada por,
\begin{equation}
\underbrace{p \cdot p \dots p}_{n_1} \cdot \underbrace{q \cdot q \dots q}_{n_2} = p^{n_1} \cdot q^{n_2}
\end{equation}

Entretanto, observe que pode existir muitas formas de se ter $N$  passos compostos por $n_1$ passos para a direita e $n_2$ passos para a esquerda. A quantidade de possibilidades de arranjos para uma dada configura de $N$ passos é,
\begin{equation}
\frac{N!}{n_1! n_2!}
\end{equation}

Daí, a probabilidade $P_N(n_1)$ de se ter $n_1$ pasos para a direita e $n_2 = N-n_1$ passos para esquerda (em um total de $N$ passos) é,
\begin{equation}\label{eqn:binomial}
P_N(n_1) = \frac{N!}{n_1! n_2!} p^{n_1} q^{N-n_1}
\end{equation}

A Equação \ref{eqn:binomial} é chamada de distribuição binomial, visto que esta é um termo típico encontrado na expansão de $(p+q)^N$ pelo teorema binomial,
\begin{equation}
(p+q)^N = \sum^N_{n=0}\frac{N!}{n! (N-n)!}p^n q^{N-n}
\end{equation}

Desta forma, escrevendo, $$ n_1 = \frac{1}{2}(N+m) $$ $$n_2 = \frac{1}{2} (N-m)$$ a probabilidade de uma partícula (bêbado) ser encotrada na posição $m$ depois de $N$ passos é,
\begin{equation}
P_N(m) = \frac{N!}{ \left( \frac{1}{2}(N+m)\right) ! \left( \frac{1}{2}(N-m)\right) !} p^{ \frac{1}{2}(N+m)}q^{ \frac{1}{2}(N-m)}
\end{equation}
onde para o caso especial de $p=q=\frac{1}{2}$, 
\begin{equation}
P_N(m) = \frac{N!}{ \left( \frac{1}{2}(N+m)\right) ! \left( \frac{1}{2}(N-m)\right) !} \left( \frac{1}{2} \right) ^N
\end{equation}

As figuras abaixo apresentam as probabilidades de encontrar a partícula (o bêbado) na posição $m$ para três situaçãoes, $p=q=0,5$; $p=0,70$ e $q=0,30$; e, $p=0,30$ e $q=0,70$. Vale frisar que, computacionalmente, poder existir alguma dificuldade em  calcular a função fatorial para números não inteiros. Desta forma, é possível utilizar a função $\Gamma$ (gama), onde $$Z! = \Gamma(Z+1) = \int^\infty_0 t^Z \exp(-t) dt$$




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